Romanos 10:17 e a fé das crianças

por Jonatas Cunha

Romanos 10:17 NVI
Consequentemente, a fé vem pelo ouvir, e ouvir a palavra de Cristo.

Paulo nos diz em Efésios 2:8 que a fé é um dom de Deus, um presente dado por Deus. Mas, o que Deus usa para nos dar essa fé? É o que ele mesmo nos responde em Romanos 10:17. Isto é, Paulo nos ensina que a fé nos é dada ao ouvirmos a Palavra de Cristo. Ouvir como? Quando? O contexto de Romanos 10 responde de forma clara:

Romanos 10:14–17 NVI
Como, então, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram? E como ouvirão se não houver quem pregue? E como pregarão se não forem enviados? Como está escrito: “Como são belos os pés daqueles que anunciam boas-novas!”. No entanto, nem todos se submeteram ao evangelho, pois Isaías diz: “Senhor, quem creu na nossa mensagem?”. Consequentemente, a fé vem pelo ouvir, e ouvir a palavra de Cristo.

Paulo nos mostra nos versículos anteriores que o que tem em mente no versículo 17 é a pregação. Ou seja, a fé vem de Deus e usa como instrumento a pregação. Nesse sentido, por exemplo, a Bíblia na versão ARA já insere essa interpretação (correta) do contexto no versículo 17:

Romanos 10:17 ARA
E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo.

Portanto, vemos que no plano de Deus para salvar seu povo, a pregação do evangelho é algo essencial. Mas o que seria essa pregação? Qualquer ocasião onde se fala sobre a palavra de Deus? Não! O termo usado para pregação no versículo 14 é “κηρύσσω (kēryssō)”. Esse termo grego diz respeito a um arauto. Ou seja, um oficial nomeado por um rei para anunciar sua mensagem de forma autorizada. Aliás, o próprio contexto aponta para isso quando Paulo fala que tal pregador precisa ser enviado, comissionado.

Você já entendeu, não é? O texto fala sobre aqueles que Deus chamou para serem seus ministros da Palavra. Homens encarregados de levar sua mensagem de forma autorizada, oficiais devidamente reconhecidos e comissionados (enviados) pela igreja para pregar o evangelho (como aconteceu com Timóteo, veja 1 Tm. 4:13–15). Quem são esses? Nossos pastores (presbíteros docentes), homens separados por Deus para o ministério da Palavra (Ef. 4:11–16; 1 Tm. 3:2 e 5:17). [1]

Resumindo, Paulo está dizendo que Deus é quem dá a fé, é claro, mas usa como instrumento a pregação do Evangelho por parte de Seus ministros [2].

E o que isso tem a ver com as crianças? Bem, depende do que acontece no culto em sua igreja. Se as crianças ficam para a pregação em sua igreja, leia para relembrar e encorajar seus líderes nessa importante decisão. Se as crianças saem para o “cultinho”, “salinha”, etc. na hora da pregação, peço que suspenda os pré-conceitos e considere com carinho o que será dito abaixo.

Pela definição bíblica que vimos acima, o que acontece na salinha das crianças na hora do culto não é pregação. Assim, quando tiramos as crianças na hora da pregação, as estamos privando do meio que Deus prometeu usar para nos conceder fé. [3]

Parece uma afirmação muito séria? É para ser mesmo, pois o assunto é de suma importância. A exortação para nós é uma só: Não tire as crianças do culto! Muito menos na hora da pregação. Deixem que cresçam tendo acesso ao meio de graça que Deus prometeu usar para nos conceder fé.

Alguns dirão, “mas elas não conseguem entender, precisam ir para salinha ouvir a mensagem em sua própria linguagem”. Ofereço quatro ponderações sobre essa fala:

  1. Subestimamos o que as crianças entendem. Você ficará surpreso em conversar com crianças que ficam no culto regularmente e tem pais cuidadosos. Elas entendem muito.
  2. Não estaríamos nós dando mais atenção às teorias sobre cognição do que Àquele que criou a cognição? Se Ele disse que usa a pregação, confiemos nEle.
  3. Peça ao seu pastor que tome ciência das crianças no culto. Elas não precisam ir para a salinha. O pastor de forma amorosa pode buscar falar de um modo que seja mais acessível às crianças.
  4. Pais, essa responsabilidade também é de vocês. Há muitos recursos hoje para ajudar as crianças a anotarem, desenharem o conteúdo do sermão. Peça sua igreja para adotar algum. Ou, procurem, façam e imprimam vocês mesmos. Vocês têm um papel primordial na fixação e explicação do que foi pregado (veja Dt. 6:7–9). Quem sabe isso até mesmo os ajudará a fazer melhor uso dos sermões que ouvem (Tiago 1:21–25).

Que ouçamos a correção de Jesus aos discípulos e jamais impeçamos nossos pequeninos de ouvir a voz de Cristo pelo meio que Ele mesmo prometeu usar.

Lucas 18:15–16 NVI
Alguns também traziam crianças para que Jesus lhes impusesse as mãos. Ao verem isso, os discípulos os repreendiam. Jesus, porém, chamou a si as crianças e disse: ― Deixem vir a mim as crianças e não as impeçam, pois o reino de Deus pertence aos que são semelhantes a elas.

[1] Se você ainda não está convencido disso, recomendo a leitura do livro Jonathan I. Griffiths, Preaching in the New Testament: An Exegetical and Biblical-Theological Study. IVP Academic, 2017. O autor apresenta de forma clara e profunda que certos termos que traduzimos por “pregação” apontam para o que oficiais da igreja fazem.

[2] Esse é também o testemunho de nossos documentos confessionais. Veja CFW 14.1, CM 154 — 155, BC 88 — 89.

[3] Não faça o texto dizer o que não está dizendo. É claro que outros momentos de ensino são válidos (por exemplo, a EBD, ensino em casa, etc.). Mas, a palavra de Deus aponta para a primazia da pregação e como Deus especialmente associou promessas a esse meio de graça.

Originalmente publicado no site do autor.

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